terça-feira, 23 de outubro de 2007

Leste e Oeste

Nunca fui um bom aluno mas nem por isso deixava de cumprir meus objetivos acadêmicos. Passar no exame do Colégio Militar, ser aprovado em todos os anos do ensino fundamental e entrar na faculdade, foram minhas grandes conquistas estudantis. O problema é que nunca fui muito dedicado aos livros. Minha mãe e meu pai podem comprovar isso. Ou meus amigos da época de colégio, o Brito e o Viana. O complicado é que esses dois últimos não tem saco de ler esse blog. Na verdade poderia apostar que eles nunca leram uma só linha do que eu escrevi aqui. Vamos ver quanto tempo eles demoram para deixar uma mensagem contrariando essa afirmação.

Voltando ao colégio, como falei anteriormente, estudar não era o meu forte. O problema é que por essa falta de interesse perdi assuntos interessantíssimos de história, literatura ou geografia. Isso sem falar do português, onde minha ortografia continua sofrível. No fim do colegial, senti que existiam lacunas em meu conhecimento do mundo e precisei de muita curiosidade para preencher esses espaços vazios. Hoje acho que sou um cara mais culto. Ou menos burro, como preferirem.













Chegando aqui na Alemanha me deparei com uma dessas lacunas. Eu sabia muito pouco sobre a história Alemã. Principalmente os fatos que ocorreram após a segunda guerra e que culminaram na divisão da Alemanha em dois blocos de influências distintas. (Os assuntos que envolvem as duas grandes guerras já me são mais familiares. Claro que essa familiaridade não vem da escola).














Como hoje a história da Alemanha faz parte da minha vida cotidiana, comecei a me interessar por esse assunto. É incrível imaginar que à apenas 17 ou 18 anos essa cidade vivia duas realidades completamente diferentes. Ainda hoje essa separação é clara e visível nas ruas de Berlim. Para mim isso tudo é muito maluco. Quando eu assisti o Bial, no Jornal Nacional, apresentando a queda do muro jamais poderia imaginar que em poucos anos estaria caminhando naquelas mesmas ruas. A vida é surpreendente mesmo.













A história dessa separação é muito curiosa e dolorida. Ao contrário do que eu imaginava, o muro foi levantado em muito pouco tempo. Como que da noite para o dia a cidade estava dividida. E não era apenas um muro separando duas metades, ele circulava todo lado ocidental da cidade. Na prática, a pequena parte capitalista de Berlim, ficava como uma ilha em um oceano comunista. Antes de falar do muro, contudo, é importante salientar que essa divisão ocorreu muito antes, ainda na Segunda Guerra Mundial.










Berlim foi conquistada pelo Exército Vermelho em maio de 1945. De comum acordo, acertado pelo tratado de Yalta e confirmado pelo de Potsdam, entre 1944 e 1945, não importando quem colocasse a bota por primeiro na capital do III Reich, comprometia-se a dividi-la com os demais aliados. Desta maneira, apesar dos soviéticos tomarem antes a cidade, e também um expressivo território ao seu redor, tiveram que ceder o lado ocidental dela para os três outros membros da Grande Aliança, vitoriosa em 1945. Assim Berlim se viu administrada, a partir de 8 de maio de 1945, em quatro setores: o russo, majoritário, o americano, o inglês e o francês.
No dia 15 de agosto de 1961, Conrad Schumann foi destacado para controlar a linha divisória na rua Bernauer. Não teve dúvida, pulou sobre o arame farpado e escapou.

Com o azedar da relação entre os vencedores, em 1948 as quatro zonas reduziram-se a duas: a soviética e a ocidental. Em seguida, Stalin decidiu-se por um bloqueio total contra a cidade em represália ao Plano Marshall, que visava promover o reerguimento econômico da Europa destroçada pela guerra. Todas as estradas de rodagem e de ferro que ligavam Berlim com a Alemanha Ocidental foram então fechadas pelos soviéticos, na tentativa de fazer com que os aliados ocidentais desistissem da sua parte na cidade. Ou saíam ou os berlinenses morreriam de fome e frio.















Em 13 de Agosto de 1961, guardas da República Democrática Alemã (RDA) começaram a fechar com arame farpado e concreto a fronteira que separava as partes oriental e ocidental de Berlim, bem como Berlim Ocidental do território da Alemanha Oriental. Agravou-se assim a divisão da Alemanha no pós-guerra, dificultando a fuga de alemães-orientais para o Ocidente.

A RDA via-se com razão ameaçada em sua existência. Cerca de 2 mil fugas diárias tinham sido registradas até aquele 13 de Agosto de 1961, ou seja, 150 mil desde o começo do ano e mais de 2 milhões desde que fora criado o "Estado dos trabalhadores e dos camponeses". O partido SED puxou o freio de emergência levantando um muro de 155 quilômetros de extensão que interrompia estradas e linhas férreas e separava famílias.

Uma mulher tenta saltar da janela de uma casa do lado oriental para fugir para a parte ocidental de Berlim. Um policial tenta puxá-la de volta, enquanto berlinenses ocidentais procuram apoiá-la na fuga, que acaba obtendo êxito. Nas semanas seguintes, esta casa – como outras na linha fronteiriça – foi demolida, abrindo espaço para a construção do Muro.







Dois meses antes da construção do Muro, Walter Ulbricht, chefe de Estado e do partido, desmentira boatos de que o governo estaria planejando fechar a fronteira: "Não tenho conhecimento de um plano desses, já que os operários da construção estão ocupados levantando casas e toda a sua mão-de-obra é necessária para isso. Ninguém tenciona construir um muro". Bom, essa história nós sabemos como acaba.
Ninguém desejava uma muralha de pedra e concreto armado mais do que Walter Ulbricht (foto), o chefe de Estado da República Democrática Alemã (RDA).



Aqui vale a pena um comentário mais pessoal. É engraçado ver como o tempo passa e as coisas são parecidas. Acho que essa é a função da história: não permitir que os erros se repitam. O problema é que como eu a maioria dos brasileiros também não estudou muito no colégio. Me lembrei do Lula dizendo que não sabia de nada nos casos de corrupção do seu governo. É impressionante como os governantes tem a capacidade de não serem informados sobre os assuntos delicados.
No dia 17 de agosto de 1962, Peter Fechter, de 18 anos, foi assassinado ao tentar fugir para Berlim Ocidental atravessando o Muro.




Por mais de duas décadas, o Muro de Berlim foi o símbolo por excelência da Guerra Fria, da bipolarização do mundo e da divisão da Alemanha.

Ainda no início de 1989, Honecker, no poder desde 1971, manifestava confiança em sua estabilidade. "O muro ainda existirá em 50 ou em cem anos, enquanto não forem superados os motivos que levaram à sua construção."

Apenas dez meses depois, a 9 de novembro daquele ano, os habitantes de ambas as partes da cidade caíam incrédulos nos braços uns dos outros, festejando o fim da muralha que acabou sendo derrubada pouco a pouco e vendida aos pedaços como suvenir. Menos de um ano depois, o país dividido desde o fim da Segunda Guerra foi unificado, mas a verdadeira integração entre as duas partes é um processo que ainda não terminou.



Os paralelepípedos marcam o caminho do Muro





Diversas rotas guiam turistas e interessados pelo que sobrou do Muro, revelando ora seu caráter artístico como na East Side Gallery, ora triste e desolador como na Bernauer Strasse, ou ainda cru e assustador na Niederkirchnerstrasse. Vários trechos, às vezes consideravelmente longos, sobreviveram à explosão urbanística que tomou conta da capital alemã na fase posterior à queda do Muro e ainda são alvo de entidades que almejam transformá-lo em patrimônio histórico alemão ou até sugeri-lo à Unesco como patrimônio cultural da humanidade.


Mais caminhos do muro.

Um comentário:

Luanna Figliolino disse...

muuuito legal! eu sempre adorei História....

aliás, vi um filme um tempinho atrás sobre esse "pós-guerra" - O Segredo de Berlim - para quem gosta daqueles filme americanos de ação! passe longe dele =)

Ideal para amantes de filmes europeus... um pouco mais "paradões".

http://www.cineplayers.com/filme.php?id=2716