terça-feira, 27 de novembro de 2007

Dualidade















Tem manhãs que acordo triste. Mais um dia em uma terra desconhecida. Olho pela janela e as gotas de água se acumulam congeladas no vidro. Através delas, distingue-se a silhueta da antena da TV. Estou sozinho e triste, com medo do clima e da vida. Abro a porta do prédio e o frio cortante atravessa meu corpo como partículas de urânio enriquecido. Caminhando pelas ruas úmidas de Berlim, vejo crianças. Elas andam animadas e conversam em seu dialeto intelinigível. Uma delas me olha nos olhos e pronuncia palavras que não consigo entender. Fico deprimido. Não me sinto capaz de um dia me comunicar em alemão. Me lembro que talvez seja esse o motivo de ainda não ter amigos de língua nativa. Quem vai perder tempo com mais um imigrante solitário e perdido? Preciso de tanto e tenho tão pouco. Deus não parece justo comigo.

Tem manhãs que acordo feliz. Mais um dia em uma terra a ser explorada. Olho pela janela e as gotas de água se acumulam congeladas no vidro. Através delas, distingue-se a silhueta da antena da TV. Fico contente por acordar com uma vista tão especial. Abro a porta do prédio e o frio me desperta para o momento mágico de viver o inverno europeu. Caminhando pelas ruas úmidas de Berlim vejo crianças. Elas andam animadas e conversam em seu dialeto curioso. Uma delas me olha nos olhos e pronuncia palavras que um dia entenderei. Fico ainda mais feliz. Que oportunidade maravilhosa de aprender uma lingual tão difícil. Assim que conseguir me comunicar, poderei fazer ainda mais amigos. Até lá vou aproveitar o tempo de solidão para me conhecer melhor e estudar arte. Tem dias que é melhor ficar sozinho para se concentrar no que interessa. Tenho tudo que preciso. Não tenho o direito de reclamar de Deus.

O truque dos dois textos é velho, mas isso não é propaganda.

sábado, 17 de novembro de 2007

Qualidades Mentais: Uma Cagada de Regra.

Maquiavel foi um grande cagador de regras. Talvez o maior cagador de regras da nossa história. Dizem que ele é o fundador da ciência política moderna. Isso sem nunca ter comandado um Estado. Em resumo, ele escreveu sua maior obra sem nunca exercer a profissão. Bom, não é exatamente sobre isso que eu gostaria de falar.

Não gosto muito de teoria, sou mais prático, mas concordo com dois de seu conceitos: o de virtù e fortuna. Atalhando o raciocínio, virtù são as qualidades necessárias para um governante e fortuna é sorte. O cara só se dava bem se tivesse as duas coisas. Eu acho simples e inteligente. Quase indiscutível.

Nas próximas linhas vou ser um pouco Maquiavel e tirar algumas conclusões metafísicas. Nada como falar de teorias que não podem ser comprovadas por um experimento científico, para cagar uma boa regra.

Sobre sorte não tenho o que falar. É algo muito subjetivo. Sendo assim, eu me interesso pelas qualidades (pelo conceito de virtù), principalmente as mentais. Nos últimos dias, pensando sobre o assunto, cheguei a uma conclusão. Na minha opinião, existem quatro qualidades mentais das quais derivam todas as outras, são elas: a inteligência, o conhecimento, a disciplina e a sabedoria.

A inteligência é meio como a sorte e poderia ser classificada como fortuna. É algo imutável: o cara nasce com ela. Ainda não existe como mudar o DNA e fazer com que uma pessoa aprenda mais rápido, tenha uma memória maior ou entenda as coisas de primeira. Isso são heranças biológicas. Um dia, quem sabe, isso deixará de ser uma loteria. Infelizmente para mim, acho que até lá já terei batido as botas.

O conhecimento é fruto do estudo, da teoria e da prática. É o nosso HD interno. Todas as informações que acumulamos são guardadas e combinadas através do conhecimento. Claro que, um cara inteligente, costuma ter esse atributo muito acima da média. Não quer dizer que isso seja uma regra. Uma pessoa inteligente e preguiçosa não se compara a um mediano esforçado. Outra coisa, o conhecimento é influenciado pelo tempo. Ele cresce e se desenvolve na medida que dedicamos esforço ao assunto. Esse é o atributo principal dos acadêmicos e cagadores de regra. É impossível defender uma opinião sem ter um bom exemplo ou analogia para cruzar com o problema proposto.

A disciplina é exercício puro. Você treina e aprende a controlar a sua mente. Certamente, disciplinando pensamentos e controlando sentimentos, fica mais fácil dominar as ações do corpo. É como a analogia da carruagem e dos cavalos, de Gurdjieff. Os cavalos são os sentimentos e pensamentos, a carruagem é o corpo. O condutor precisa saber levar os cavalos para controlar melhor o carruagem. A disciplina é o que permite aos Sadhus suportarem a dor em seus votos sagrados. Quem de nós teria a capacidade de ficar 15 anos com um braço levantado ou 20 com uma faca atravessada em um membro? Nem o BOPE e nem SELVA.



A sabedoria é a qualidade mais importante, na minha opinião. Ela independe da inteligência e do conhecimento, é fruto da simples observação e entendimento dos fenômenos da vida. Um homem do campo, pode ter um conhecimento raso e uma sabedoria profunda. Num mosteiro, existem monges que só estudaram religião durante toda a vida. Mesmo assim, estes esconder uma sabedoria magnífica. Um outro ponto: ela é imensamente atrelada a interpretação correta das experiências do tempo. Costuma vir com a idade, com os erros e acertos da vida. Mesmo assim existem exceções onde velhos são mesquinhos ou cegos emocionais. Em todo caso, são raros os que não apresentam uma vasta sabedoria. Tudo porquê grandes perdas, traumas, dores, amores, beijos não podem ser aprendidos em livros. Estas experiências apenas podem ser vividas. Um ensinamento budista fala exatamente sobre isso. Nele, um monge exemplifica a dificuldade de explicar o nirvana com a seguinte pergunta:. ---Como demonstrar o sabor do mel para quem nunca provou?

Como todo bom cagador de regras, para fundamentar um pouco a minha teoria, vou falar de algumas alegorias antigas que ilustram meu pensamento.

O Evangelho Segundo São Mateus trata da vida de Jesus. No entanto, um livro não aceito em nossa Bíblia traz histórias do filho de Deus, antes dos 30 anos. Seu nome é A infância Segundo o Evangelho de Thomas. Nesses manuscritos Jesus é apresentado como uma criança normal, que inclusive usa os seus talentos de forma irresponsável. Na primeira parte do livro Jesus brinca na lama do rio Jordão fazendo pássaros (vivos é claro) da areia da margem. Com 5 anos, ele usava seus poderes para humilhar seus professores, derrubar seus amigos, mostrando um lado até mesmo cruel. No segundo ato Jesus tem 8, ele descobre sua responsabilidade e usa o seu poder para o bem. Entre os feitos dessa parte do livro está um milagre onde ele iguala as arestas de um móvel que seu pai cortou errado e, com uma semente, plantou comida para uma centena de pobres. Com 12, na terceira parte, ele já era o Jesus sábio do Novo Testamento.

É impressionante imaginar que, de tão popular, algumas histórias desse livro foram incorporadas ao Alcorão. Hoje esse texto quase não existe. Um testamento que ensinava a essência do despertar da sabedoria, em uma pessoa inteligente e culta. Aqui ainda vale um parêntese. É impossível falar desse testamento e não lembrar do clássico do Allan Sieber “Deus é Pai”.



Outro exemplo é quando o Dalai Lama falou que o Budismo cometeu erros no Tibete. O principal deles foi isolar-se do mundo, incluindo não participar da ONU. Esse pecado foi pago por um preço muito caro. O Tibete foi invadido pela China. Na minha opinião essa ilha de sabedoria ficou afastada do conhecimento do oriente. Não se modernizou em alguns aspectos importantes, principalmente na política e na medicina. Enquanto isso seu vizinho Butão continua com uma monarquia vitalícia. Não teve a infelicidade do Tibete graças as manobras de seu governante. Mesmo sendo o país mais fechado do mundo, ganha alto com o turismo e investe mandando seus médicos e professores para estudar no oriente.

Será que o rei Hussein, de 1998, comandaria as tropas jordanianas, favorável a união árabe, em um ataque a Israel? Ataque esse que lhe custou metade da cidade sagrada e as terras a oeste do rio Jordão. Isso sem falar em um atentado terrorista, (de seus irmãos árabes Palestinos) que quase tirou sua vida. Será que ele tomaria essa decisão, tendo aparentes cabelos brancos, mesmo sem saber que o resultado seria a derrota?



Como toda teoria bem formatada, esse conteúdo pode encontrar respaldo em outros exemplos. Eu acho que esses três que escrevi, explicam bem minhas idéias. Infelizmente, como a maioria das cagadas de regra, esse conteúdo revela-se pura especulação. Como já falei, não pode ser comprovado fora do ambiente do laboratório mental. São apenas palavras ao vento. Um pouco de inteligência burra para divertir o cérebro, até que outra teoria maravilhosa ocupe o espaço vago antes por Maquiavel.

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Meteoro e Dinossauros

Qual sera o futuro da propaganda? Tem dias que me pergunto como será nossa profissão em alguns anos. Acho que esse pensamento é fruto do medo que tenho de ficar obsoleto. Não fazem muitos anos um meteoro caiu no Mercado de publicidade e varreu profissionais que não conseguiram se adaptar a um novo ambiente. O nome dessa catástrofe se chama computador.
















Não sei se o apocalipse está próximo. Na verdade, acho que as mudanças serão mais graduais que no passado. Assim, a saída para os dinossauros não é a extinção, mas a evolução para a forma de pássaros. Não sei se essa opinião é fruto de um desejo ou uma análise crítica de nosso mercado. O fato é que para que essas mutações ocorram em mim, procuro observar os novos caminhos que se colocam a frente. Desafios que talvez apontem para uma tendência na forma de se comunicar com as pessoas.

Não foi uma vez que escutei comentários, após festivais de propaganda, que tudo estava muito igual. Os amigos voltam dos julgamentos um pouco abatidos e frustrados por não encontrarem saída para a padronização dos layouts e soluções criativas. A maioria deles critica os atalhos e fórmulas que fazem parte da nossa cultura publicitária. Olham para esses raciocínios comuns e julgam encontrar o culpado para essa invariabilidade criativa. Acho que eles estão certos mas talvez existam outros caminhos para sair do labirinto.

Nos últimos anos especialistas apontaram seus telescópios para o céu e viram um novo meteoro chegando. Muitos diziam que o potencial de destruição desse asteróide era ainda maior que o computador. No fim das contas ele chegou caiu e não provocou mudanças imediatas. A internet chegou ao nosso mundinho e modificou pouco nosso processo criativo. Claro que alguma coisa ficou diferente mas a extinção em massa não aconteceu. Não sei se estamos mais preparados para essas mudanças ou se essa inovação tecnológica era suficientemente avassaladora para revolucionar nossa forma de anunciar. Na verdade, acho que os benefícios da internet foram tão grandes que ajudaram, inclusive, a impulsionar e renovar nossas mídias convencionais. Além de facilitar muito as pesquisas, tão fundamentais em nossa atividade de trabalho. Em todo caso aprendemos e assimilamos essa ferramenta de forma mais rápida que as gerações passadas fizeram com o computador. Nada como nascer em um mundo digital. Se esse asteróide não acabou com os novos dinossauros existiria algum outro tipo de catástrofe capaz de os exterminar? Sinceramente acho que não.

Como diria o capitão nascimento, vou retomar o raciocínio. Voltando aos festivais, onde poucas mudanças foram percebidas em press nos últimos 5 anos. O que foi apresentado de novo? Existe alguma tendência? Acho que sim. Uma delas é encarar qualquer forma de contato com o consumidor como uma mídia em potencial. Um chaveiro, um papel-higiênico, uma caixa de fósforo ou coco de cachorro com uma bandeirinha anti-bush podem ser meios de se comunicar com as pessoas. Aqui na TBWA os caras chamam isso de Media Arts.

Para provar que esse é um novo caminho, vou lembrar como o Leão de Mídia se tornou um prêmio valorizado. Me lembro que à 4 anos um amigo ganhou um e me disse: ----- É de mídia mas é legal. Porra, claro que é legal. Imagino que hoje ele não trataria o prêmio como inferior a um leão de press. Ou trataria? Aqui na Europa isso não acontece.

No velho mundo, essa é a tendência. Pelo menos é sobre isso que a maioria dos gurus da propaganda fala. Provavelmente essa informação não é novidade para você que está lendo esse blog. Certamente sua agência se vende como 360 graus, ou 180 ou 720. Todas essas denominações são comuns e já encheram o saco. Agora, sinceramente, você ainda acredita nesse discurso? Você realmente acha que o lugar onde trabalha cumpre com esse objetivo básico? Ou você acredita que isso é só um papo bonito para se vender melhor para o cliente? Quando estava no Brasil não achava as agências tão engajadas assim.

Como sou um moleque atrevido, vou discorrer sobre os motivos que me levam a achar que estamos perdendo essa corrida no Brasil. Vou levantar algumas possíveis razões mas não vou ser maluco o bastante para propor soluções. Sim, serei o típico engenheiro de obra pronta.

O primeiro deles é o comodismo. É muito mais fácil fazer TV e press (jornal ou revista). A mídia e os formatos já são padrão. Os resultados mais previsíveis e todos já sabem os atalhos. Não é necessário estudar muito, basta abrir um formato básico e pensar onde colocar o logo e o titulo. Tudo bem, não é assim tão fácil mas é um terreno mais conhecido e menos assustador para os mídias, produtores gráficos e criativos. Ainda mais com os nossos prazos mas esse já é outro problema.

Me lembro claramente de algumas frases que escutei de chefes no passado. Frases essas que me deixavam irritado e me faziam sentir inferiorizado. Vou falar sobre elas nesse parágrafo para introduzir o próximo assunto. A primeira é essa: “---- Faz esse folhetinho direito porquê nego já ganhou leão com isso.” O problema é que o mesmo cara dizia essa outra frase: “------ Folhetinho? Isso tu mata em meia hora.” O que eu deveria perguntar é se ele gostaria de ver o trampo morto ou o leão? Sim, tenho que assumir o fato que não sou bom o bastante para conseguir as duas coisas ao mesmo tempo.

Assim chegamos ao segundo motivo: o tempo. No Brasil não temos tempo para pensar sobre o trabalho. Para ficar no exemplo do folhetinho. Sabem quanto tempo eu tive para criar um encarte de produtos da adidas aqui na agência? Uma semana. Isso apenas para mostrar idéias, depois o estúdio de design trabalhou mais 10 dias no crafting antes de mostrar para o cliente. Claro que saíram idéias diferente e legais. Claro que ficou muito mais bacana do que o folhetinho que executei para o chefe cagador de regra. Aí é que eu me lembro de uma máxima que um amigo redator sempre me falava: “Todo prazo tem o trabalho que merece.”

O outro problema é a remuneração das agências. Nós não somos parceiros dos clientes, somos parceiros da Globo. Os nossos chefes não nos incentivam a criar mídias diferenciadas pois as agências nem sabem cobrar pelo serviço. É muito mais conveniente criar um filme e embolsar a porcentagem sobre a mídia e mais aquele bom e velho BV. Isso sem falar nos acordos que permeiam o mercado editorial. Tudo direciona nossas ações para o convencional.

Não vou me estender mais nesse assunto pois posso parecer exatamente o que eu condeno. Eu não sou um bom cagador de regra. Apesar de esse texto ser lindo para se falar em uma palestra na faculdade, não é bom o suficiente para apontar todos os problemas e muito menos soluções para esses. O objetivo dele é apenas provocar algum tipo de reflexão no leitor. Reflexão essa que eu não tive a capacidade de fazer antes de sair do mundinho.

Outra coisa é que não sou pitonisa, como diria o meu pai. Tudo que falei pode se provar uma tremenda idiotice no futuro. O Burti pode comprar uma máquina alemã que imprime anúncios animados e revolucionar o mercado editorial da noite para o dia (essa máquina não existe). Isso tudo que escrevi são apenas pensamentos desconexos e datados de um cara que sempre se preocupou com o futuro, não devem ser tratados de forma diferente. Existem os que concordam e os que discordam, no fim todos descobriremos a verdade em 10 anos.